Com a economia praticamente parada, o ministro das finanças Mário Centeno estima uma quebra do PIB da ordem dos 460 milhões de euros por cada dia útil. Por sua vez, o Fundo Monetário Internacional (FMI) estima uma quebra anual para o nosso país da ordem dos 8%, praticamente idêntica á quebra histórica ocorrida em 1974, na altura do 25 de Abril que pôs termo ao antigo regime. O nosso PIB em 2019 cifrou-se em 212,3 mil milhões de euros. Com esta quebra teremos uma fortíssima redução na arrecadação de impostos, nomeadamente IVA, IRS e IRC, conjugada com um aumento impressionante da fatura social pelo apoio aos novos desempregados, trabalhadores em “lay-off” e outros relevantes gastos sociais.
Como economista fiquei estarrecido ao ouvir o primeiro-ministro, a primeira figura da governação do país, em entrevista à Lusa. À pergunta se não haveria austeridade, se poderia garantir que os salários e as pensões não conheceriam qualquer corte e os impostos não seriam aumentados, respondeu que «os portugueses podem estar seguros de que não adotarei a mesma receita de 2011 e que a doença é claramente distinta da anterior».
Um dia depois, o ministro de Estado e da Economia, Siza Vieira, que normalmente já nos habituou a falar pouco, mas a dizer o que deve ser dito, a uma pergunta se não haveria subsídios a fundo perdido para as micro e pequenas empresas, na condição de não procederem a despedimentos, respondeu: «Ouça, despesa do Estado hoje são impostos amanhã». Está tudo dito.
Em entrevista ao “Expresso”, dois dias depois, o primeiro-ministro, à mesma pergunta sobre a possibilidade de aplicar medidas de austeridade, dá o dito por não dito, utiliza precisamente as palavras do seu ministro da Economia e acrescenta: «Não dou uma resposta que amanhã não possa garantir». Porquê esta viragem no discurso?
Sabemos que não é fácil ser Governo numa altura destas, nomeadamente com uma divida publica tão elevada, mas há coisas por demais evidentes para que não tenham respostas claras, concisas e realistas, de contrário é não dizer a verdade aos portugueses, como tem acontecido noutras situações. Todos nos recordamos quando o primeiro-ministro anunciou a implementação das 35 horas para a função pública, condicionando essa redução ao não acréscimo de despesa pública, como se isso fosse possível. Naturalmente não haveria acréscimo de despesa se, milagrosamente, a produtividade aumentasse 12,5%, mas, pelo contrário, a nossa produtividade é das mais baixas dos países da União Europeia. Contas feitas pela imprensa especializada, esta medida implicou uma despesa anual da ordem dos 800 milhões de euros.
Por muito que nos custe, apesar de discursos titubeantes, que nada resolvem, a austeridade vai fazer parte das nossas vidas. Aliás, ela já aí está: cerca de um milhão de trabalhadores em “lay-off”, recebendo dois terços dos salários, acréscimo de 4.000 desempregados por dia, inquilinos que não pagam as rendas, que atiram alguns senhorios para situações bem difíceis, o que é isto senão austeridade?
E o que irá acontecer com a nossa divida pública, que forçosamente terá que subir e muito? Será sustentável, de modo a satisfazer os credores para que as taxas de juros não sofram uma escalada?
Sabemos que a Economia, sendo uma ciência social não é uma ciência exata, mas não há muitos segredos. Adam Lebor, no seu fascinante livro “A Torre de Basileia”, cita Stephen Ccechetti, um conceituado economista americano, ao referir que níveis de elevados endividamentos são um «fardo ao crescimento». Não há crescimento sem restauro estrutural e uma gradual, mas credível, redução dos níveis de endividamento. «Como aprendemos em anos de experiência com crises, tanto em mercados emergentes como em economias avançadas, a escolha entre austeridade e crescimento é falsa. A verdadeira escolha é entre austeridade e colapso. E isto não é escolha nenhuma».