Quem circulou no início de maio pelas estradas nacionais que, de alguma forma, levam a Fátima, deparou-se com um mar de gente, alguns de colete refletor vestido, caminhando pelas bermas. Esta circulação em massa em circunstâncias de risco (todas as peregrinações há pessoas atropeladas) é recorrente, verificando-se em maio e outubro e, em alguns casos, noutros dias 13 do ano.
As questões da fé não são para aqui chamadas. O ponto é que as pessoas têm o direito de caminhar para onde entendem, nos dias que quiserem, sem se colocarem em perigo a si próprias ou aos condutores.
Não é só em Portugal que se peregrina. Por isso vale a pena perceber como outros países lidaram com a questão para ver o que se pode aprender com eles. Em Espanha, onde as peregrinações a Santiago de Compostela, na Galiza, são quase milenares, criou-se uma rede de caminhos cujos trajetos são maioritariamente feitos por vias rurais sem automóveis ou de pouco tráfego, cujas regras de circulação permitem a segurança de transeuntes e, ao mesmo tempo, valorizam a paisagem rural e interior, criando atividade económica, emprego e valor nos locais de passagem.
Com isto, podemos concluir duas coisas. A situação existente em Portugal nas peregrinações a Fátima está mal e pode e deve ser mudada para melhor. E não é preciso ir muito longe para encontrar inspiração para resolver o problema. Assim sendo, compete às estruturas administrativas e políticas do Estado construir uma solução que, respeitando o direito dos cidadãos à fé religiosa e à segurança, seja também boa para valorizar e estruturar o território, animando a sua economia.
Pela parte que me toca, deixo aqui uma proposta. Com a mesma lógica dos “Caminhos de Santiago”, cada Comunidade Intermunicipal – CIM do continente deveria reunir o consenso dos municípios que as constituem para, no território comum, desenharem a sua rota de caminhos para Fátima destinados aos caminhantes. Para além da escolha das vias mais adequadas, os caminhos deveriam ter indicações claras ao longo do seu curso e, nos lugares, aldeias ou vilas por onde passassem, as autarquias respetivas deveriam construir instalações sanitárias e zelar pelo seu bom funcionamento e manutenção. Os comerciantes, cafés, restaurantes e hoteleiros de cada sítio fariam o resto.
Existe financiamento europeu para projetos destes, pagos por Bruxelas a 85% do custo total. O resultado seria bom para os peregrinos e, sobretudo, para terras onde estes passassem. Salvo melhor opinião, é daquelas ideias em que todos ganham.
* Dirigente sindical