Comboios: contra a demagogia, pela região e pelo país

Escrito por Acácio Pereira

A última coisa de que me lembraria seria defender um “elefante branco” para a Beira Interior. Os comboios são uma coisa muito séria – muito úteis quando a infraestrutura e o nível de serviço estão adaptados ao mercado, insustentáveis quando tal não acontece.
No caso da Beira Interior, Beira Alta e Beira Baixa, temos a pior situação possível. Infraestruturas desqualificadas, quer ao nível da via, quer ao nível das estações. Um péssimo serviço. E uma disfunção do mercado: falta procura para a oferta existente, falta oferta para a procura que existe.
As questões são as seguintes. Há, ou não há, mercado potencial nas Beiras para o transporte ferroviário de mercadorias? Há, ou não, mercado potencial nas Beiras para o transporte ferroviário de passageiros?
As respostas não podem ser levianas. Têm de ser baseadas em estudos e projeções reais, intelectualmente honestas, cientificamente sustentadas. Está ao alcance da região fazê-lo: duas universidades, três institutos politécnicos, várias associações empresariais e mais de quatro dezenas de municípios em três distritos são massa crítica suficiente para que Castelo Branco e Covilhã, Guarda e Viseu saibam o que é lúcido e estratégico defender.
Sem esses estudos – e sem ter líderes políticos nos distritos com visão e dimensão para se entenderem sobre este assunto – resta aos cidadãos dizer dois ou três lugares comuns.
Primeiro. O transporte de carga por via férrea representa menos de 1% do total do tráfego de mercadorias com origem e destino em Portugal. Este apenas é competitivo com o transporte rodoviário em grandes distâncias e grandes quantidades.
Segundo. No transporte de passageiros vê-se a olho nu que não há movimentos pendulares significativos, nem no eixo Castelo Branco-Covilhã-Guarda, nem no eixo Viseu-Guarda. Onde há procura e interesse potencial evidente é nas ligações entre qualquer uma destas cidades e Lisboa, seja através da Linha da Beira Alta, seja através da Linha da Beira Baixa.
Procura potencial, sublinhe-se. Com os níveis de serviço atuais – maus na Linha da Beira Alta, péssimos na Linha da Beira Baixa – a procura está limitada à nascença. Logo, a questão é a mesma: o nível de procura potencial justifica, segundo bons critérios, o investimento nacional nas ligações ferroviárias às Beiras?
Se sim, estas têm de avançar. Se não, deixemo-nos de demagogia e encaremos de frente o fecho da Linha da Beira Baixa e a inevitável degradação da Linha da Beira Alta. Pior do que perder uma coisa é não saber lidar com a realidade. Esta acaba sempre por se impor.

* Dirigente sindical

Sobre o autor

Acácio Pereira

Leave a Reply