O solo do fundo do mar ocupa 151 milhões de quilómetros quadrados da superfície da Terra. Isto representa 41% dos oceanos da Terra e 29,5% da superfície do planeta. A maioria desta enorme extensão está coberta por excelentes sedimentos macios, acumulados em milhões de anos. Os depósitos do oceano consistem em biliões de conchas de organismos microscópicos, calcários e sílica, e também partículas provenientes de erosão da terra. Há também pequenos fragmentos meteoríticos, chamados microtequites, nos sedimentos do fundo. As condições nas profundezas têm sido resumidas como profundas, negras, frias e com pouca comida. Esta restrição de suprimento alimentar e das temperaturas baixas provocam crescimento lento dos organismos.
A superfície macia de sedimentos nas profundezas torna difícil os habitantes de superfícies grandes moverem-se nelas sem se afundarem, ou terem de usar muita energia quando tentam deslocar-se. A necessidade de poupar energia, para crescer e reproduzir-se, é uma pressão evolucionária forte num ambiente com escassez de comida.
Para sobreviver a estas condições, os seres vivos desenvolvem modificações nos seus organismos que passam por adaptações nos órgãos sensoriais, na cor ou na forma.
Órgãos sensoriais
É um paradoxo que na escuridão das profundezas muitos animais tenham olhos com complexidade e sensibilidade extremas para detetarem luminosidade muito fraca da superfície e ocasionalmente emissões de bioluminescência. Muitos animais têm também sentido olfativo muito desenvolvido para detetar comida ou companheiros. Os sentidos do tato e do ouvido estão separados nos vertebrados terrestres, como os humanos, mas esta distinção é menos clara nas profundidades. Aqui, a água é, de longe, melhor transmissor da pressão de ondas de frequência baixa do que o ar. O que designamos como sentido auditivo é, em muitos animais do fundo do mar, o sentido do tato: eles detetam vibrações de outros animais. Muitos invertebrados ouvem usando pelos ou antenas, e nos peixes as funções do sistema de “linha lateral” são como o nosso ouvido: pelos sensoriais transformam movimentos microscópicos em impulsos nervosos. Muitos peixes produzem sons e assim podem também processar um sentido de audição tal como a compreendemos.
Cor
Os tipos de coloração dos animais das profundezas são uma resposta à necessidade de camuflagem, estratégia para caçar ou para evitar ser caçado. A cor serve muitas vezes para o animal se confundir com o meio circundante de modo a não ser notado. Há frequentemente uma luz ambiente residual na zona mesopelágica superior do fundo do mar. É aqui que as alforrecas, os camarões e os peixes-pinha se encontram em vários graus de transparência. A cor muda de modo muito marcado nas partes profundas da região mesopelágica. Os peixes tornam-se prateados ou, nos níveis mais baixos desta região, negro-aveludado para absorver o que de luz fraca possa estar presente. Nesta região, os invertebrados são tipicamente de cor laranja e vermelho, que pode ser parcialmente consequência de uma dieta rica em pigmentos vermelho e laranja. A luz vermelha está completamente ausente nessas profundidades, pelo que parecem negros ou cinzentos, quando iluminados pela luz azul ténue que penetra até esse fundo distante. Como não há luz na parte mais profunda do oceano, além da bioluminescência, a maioria dos animais não tem coloração forte.
Forma
Os peixes são um dos grupos principais de animais das profundezas e apresentam algumas das diferenças maiores de formas do corpo quando comparados com o parente de águas baixas. Isto é possivelmente uma consequência da escassez de comida e das estratégias que os peixes desenvolveram para lidar com ela. A perseguição ativa neste ambiente é energeticamente dispendiosa e, assim, a maioria dos peixes são predadores emboscados, movimentando-se muito pouco. Isto significa que os seus corpos não precisam de ser hidrodinamicamente eficientes. Podem ser grossos ou finos, longos ou curtos, com musculatura reduzida. A carne dos peixes de fundo é mole e aguada em comparação com a das espécies de águas baixas, o que se deve à falta de fibras musculares. Têm bocas grandes e dentes aguçados para assegurar que, nas ocasiões raras em que a presa é encontrada, não possa escapar.
É neste mundo escuro e frio, que começa cerca dos 200 metros abaixo da superfície, que encontramos formas de vida que evoluíram em condições muito diferentes das que contactamos à superfície e a partir da quais podermos compreender melhor a vida no leito das profundezas.
Por: António Costa