Paul Kammerer foi um dos biólogos mais importantes da primeira metade do século XX. Austríaco de nascimento, em setembro de 1926 suicidou-se com um disparo na têmpora. Foi acusado de fraude nas suas experiências científicas. O que terá acontecido?
Fiel defensor da teoria de que as capacidades que os animais adquirem são transmitidas à sua descendência, tentou a todo o custo introduzi-la nas suas experiências, tal como no século anterior Lamarck tinha exposto a sua teoria evolutiva como o exemplo dos pescoços compridos das girafas. Com esta teoria Lamarck reconheceu que as espécies atuais tinham mudado graças a um processo comum a todos os seres vivos: o processo de adaptação ao meio ambiente. O facto das girafas terem hoje o pescoço comprido, por exemplo, é consequência destes animais – que antigamente eram morfologicamente parecidos com antílopes – se esticarem para se alimentarem das folhas das árvores. Para Lamarck, estas mudanças (ou caracteres adquiridos) respondem ao uso ou falta de uso dos órgãos e são transmitidos à descendência. Esta é a síntese da tese de Lamarck de como as espécies iam evoluindo.
Regressemos a Kammerer, este quis demonstrar o mesmo experimentando com sapos parteiros. Para isso, treinou os sapos parteiros para que acasalassem na água – como fazem as rãs – e não no solo. No caso das rãs, quando o macho tem de interagir com a fêmea para que ela expulse os ovos que deve fecundar, este eriça umas diminutas espinhas nos seus dedos traseiros que lhe permitem agarrar-se melhor ao escorregadio dorso da fêmea. Kammerer demonstrou que os seus sapos parteiros, forçados a procriar na água, também pareciam ter desenvolvido estas mini-espinhas nos dedos. O cientista apresentou os seus resultados em 1923 na Universidade de Cambridge e a descoberta causou surpresa entre os presentes. Até que, em 1926, Kingsley Noble, um tratador de répteis do Museu Americano de História Natural, visitou Kammerer no seu laboratório e descobriu a verdade da questão: não era que o sapo tivesse de factos as espinhas – os sapos parteiros não têm essas almofadas precisamente porque se reproduzem em terra –, ele é que tinha injetado tinta-da-china para destacar o que de outra forma seria invisível.
A fraude foi publicada na revista “Nature” e destruiu a carreira e a vida de Kammerer, que não resistiu à vergonha. Antes da sua morte, Kammerer admitiu as conclusões de Noble, mas declarou-se inocente, sugerindo que não tinha sido ele a forjar a experiência, mas que se tratara de uma conspiração.
Por: António Costa