P – De que trata esta autobiografia, intitulada “Deixa-me ser”?
R – Gosto mais de lhe chamar “livro biográfico” por relatar um período da minha vida. E esse período foram quase 10 anos em que vivi uma luta comigo próprio, com a minha família e a sociedade depois de assumir a minha homossexualidade aos 20 anos. De certa forma essa luta continua, mas eu decidi contar uma história que na minha vida já teve princípio e fim, que foi a de o meu pai não aceitar a minha orientação sexual, passando por muitas dificuldades até ao dia em que consegui ter o seu total aceitamento e todo o apoio que sempre quis.
P – Por que motivo decidiu escrever este livro?
R – Para mostrar que há histórias de homofobia e preconceito com finais felizes. Para inspirar outras pessoas que possam passar pelo mesmo. E para alertar as pessoas no geral para o sofrimento a que estamos sujeitos por algo que nem sequer escolhemos ser. Também quero derrubar barreiras com a minha história de vida, chegar ao coração dos leitores e contribuir para acabar com o preconceito. Sei que não tenho o poder para o erradicar, mas se cada um fizer um pouco do que está ao seu alcance, o mundo será sempre um lugar melhor. Acredito nisso.
P – Que mensagem pretende passar?
R – A mensagem de que tem de haver sempre esperança e de que tudo pode melhorar. Por exemplo, atualmente em Portugal já temos muitas leis conquistadas, já podemos casar, adotar, etc. Há uns 30 anos talvez ninguém acreditasse que isso iria ser possível. Mas aconteceu, talvez porque aí pelo meio houve outro alguém que nunca perdeu a esperança, nem deixou de lutar por estas causas.
P – Considera que ainda vivemos numa cidade/sociedade preconceituosa?
R – Como disse antes, no caso do nosso país, já evoluímos bastante… Pelo menos a nível legal. Isso não muda de repente a consciência ou os preconceitos das pessoas, mas ainda assim também acredito que mesmo nesse campo já estamos mais à frente. Ainda há muito preconceito, sim, e não podemos nunca deixar de lutar contra ele. Nas escolas ainda existem muitos casos de “bullying” contra quem tem uma orientação sexual ou identidade de género diferentes, por isso cá estamos para continuar a alertar para isso. E para lutar por mais aceitação, sempre.
P – Não teme que este livro lhe possa trazer uma maior exposição?
R – Sem exposição e sem visibilidade raramente conseguimos conquistas. Admito que de início, antes da publicação, temi muito por isso, por expor muito de mim. Mas a partir do momento em que comecei a fazer apresentações do livro pelo país e depois de passar por Leiria, Torres Novas, Lisboa, Porto, etc, de imediato percebi que das pessoas só recebia carinho e apoio. Isso compensou qualquer medo de uma exposição maior. E de facto não havia outra forma de contar o que vivi, sem ser assim, absolutamente sincero e transparente.
P – De que forma a Covilhã, onde é passada parte da história, o ajudou a descobrir-se?
R – A Covilhã foi o meu ponto de mudança. A partir do momento em que fui estudar para a Universidade da Beira Interior, sendo a primeira vez que saí de casa dos pais para ir morar noutra cidade, comecei a ter contacto com outras realidades, novas formas de pensar e a ter menos medo de ser eu próprio. Na Covilhã também conheci pessoas fantásticas, que depressa se tornaram elos de amizade muito fortes e que sempre me inspiraram a ser só o que sentia ser. Por esta cidade só tenho amor.
Perfil:
Idade: 30 anos
Profissão: Escritor
Currículo: Humanidades e Ciências da Comunicação
Naturalidade: Torres Novas
Livro preferido: “Ensaio Sobre a Cegueira”, de José Saramago
Filme preferido: “Beleza Americana”, de Sam Mendes
Hobbies: Cinema, videojogos, ler.