Boquiabertos, a maioria dos portugueses mostrou um grande desagrado por a Time apresentar em primeira página uma fotomontagem, do centro de Bragança, com um título sugestivo: “Europe’s new red light district” (o novo bairro europeu de prostituição). A questão não é da dimensão da prostituição. O bairro de St. Pauli, uma zona que vive do sexo em Hamburgo, é maior que a cidade de Bragança.
O assunto tem interesse pelo paradoxo. Bragança é uma pequena cidade provinciana, conservadora, católica e pacata, numa das regiões mais atrasadas da Europa. Foi num quadro rural de conflito de paróquia que surgiu o autodenominado Movimento das Mães de Bragança – que na verdade são esposas despeitadas – e acabou por ser uma enorme campanha de propaganda do negócio.
Do outro lado da fronteira, em Espanha, os “club’s” apareceram como cogumelos nos anos setenta e hoje há comunidades que estão a legalizar a prostituição. Só em Fuentes de Oñoro existem três casas de alterne!
No seguimento dos protestos das “Mães de Bragança” falou-se muito das casas de alterne da Malta e de Santana da Azinha. Passámos todos a falar diariamente do escândalo… As televisões não se cansaram de repetir as imagens do local do “crime”. Mas qual crime? Não é a prostituição “a mais antiga profissão do mundo”? E em vez de se combater a prostituição preconizando uma integração social, promove-se a perseguição e a xenofobia?
Não era só na Malta ou em Santana da Azinha que havia “casas de meninas”. Esses locais estão espalhados um pouco por todo o lado. E há muito tempo.
Na primeira metade do século vinte a Guarda teve um bairro de prostituição – o Poço do Gado, em S. Vicente – com regras estritas de higiene e controle sanitário, em que as “mulheres” só podiam sair à cidade com um passaporte onde constava o registo médico de como não tinham qualquer doença.
No início dos anos oitenta, os guardenses conviveram com meia dúzia de bares de alterne a funcionar em simultâneo – “Picadilly”, “Tequilla”, “Tocha”, “D. Sancho”, “Nau”, “Titanic” (os últimos dois funcionaram durante muitos anos). Depois apareceram outros bares onde se podia ir “beber e conversar com uma menina”. O “Solar do Mondego” é o mais famoso, mas não o único. Durante os últimos anos a rota dos bares de “meninas”, nomeadamente brasileiras, húngaras e ucranianas, fez-se por Foz Côa, Ponte de Abade, Celorico, Boidobra, Inguias, etc. Na Guarda (Torrão) e no Fundão havia há pouco tempo uma casa de prostituição com uma promoção original: «Duas Amigas – amigas desinibidas» (anúncio de O Interior, Janeiro de 2001).
Não entendo, pois, as razões para ficarmos escandalizados com o que a Time retratou.
O que me envergonhou não foi a capa da Time, foi a decisão do Governo de cortar a publicidade que fazia na revista. Um gesto mesquinho, terceiro-mundista e atentatório da liberdade de informação. Nada a que nós, neste jornal, não estejamos habituados. As Câmaras da Covilhã, da Mêda ou de Celorico da Beira (no tempo de Júlio Santos), por exemplo, praticam habitualmente esta saloiice. Como o Governo, também os autarcas têm a pequenez de carácter de não fazer publicidade nos jornais que não são “amigos”. Afinal continuamos a viver numa sociedade intolerante.
Luís Baptista-Martins