António José Baptista espera cativar os eleitores de esquerda e os abstencionistas para aumentar a votação no Bloco de Esquerda nas eleições de 5 de junho. Se for eleito, o cabeça-de-lista pela Guarda promete lutar pela regionalização e garante que o lugar será rotativo pelos restantes elementos da lista.
P – Qual é a sua meta em termos eleitorais?
R – Ser eleito, obviamente. Não vai ser fácil porque jogamos com “armas” e uma capacidade de propaganda muito inferior à dos concorrentes no poder. Mas todos os partidos partem com zero votos e tenho esperança de conseguir fazer chegar a mensagem e obter cerca de 20 mil votos, que serão os necessários para eleger um deputado pela Guarda.
P – Nas últimas legislativas o Bloco de Esquerda foi um dos partidos que mais cresceu relativamente a 2005. Acha que é possível aumentar ainda mais esta votação?
R – É um objetivo possível que só depende da vontade dos eleitores e sobretudo dos abstencionistas, que são quem poderá mudar o rumo dos acontecimentos e protagonizar uma grande surpresa.
P – O grande alvo do BE será então esses eleitores…
R – E não só. Queremos cativar as pessoas de esquerda, as que têm votado noutros partidos e especialmente quem tem desperdiçado a oportunidade de votar. Curiosamente, são as que mais se queixam e também as mais responsáveis pelo estado a que chegámos, pelas maiorias palacianas que nos têm governado.
P – Voto útil versus voto de protesto, qual acha que vai ganhar a 5 de junho?
R – A frase que vamos usar na nossa campanha diz que “O voto útil é o teu”. O voto útil é uma fantasia que os dois partidos do arco do poder usam para fazer crer que só há duas hipóteses. É mentira, o voto útil é todo aquele que as pessoas resolverem dar à força política em que acreditam. Já o voto de protesto também pode ser considerado de voto útil, mas é outra aberração, porque pode ser qualquer um. Portanto, são dois chavões que interessam aos partidos do poder. O BE quer cativar não só as pessoas que mais se queixam, mas também aquelas que percebem que somos a única força com soluções concretas para a situação dificílima em que estamos.
P – Ainda que não concorde muito com estes dois tipos de votos, qual deles assenta melhor ao BE?
R – Ao BE assenta melhor o voto super-útil, o voto certo. Mas todo o voto é útil.
P – O que faria se fosse eleito deputado pelo distrito?
R – Primeiro, não pretendo ser deputado a tempo inteiro, pois há sete pessoas na lista e todos temos que dar o nosso contributo. A minha profissão não é político, além de que não nasci para viver em Lisboa e odeio viver em grandes cidades. Penso passar lá uns meses e depois dar lugar aos outros candidatos. No meu caso, vou concentrar-me naquilo que considero fundamental para a região, que é a regionalização, a união com a Beira Baixa. Farei também um apelo e uma sensibilização às restantes forças políticas para se discutir, olhos nos olhos, a questão da agricultura e utilizarei a minha influência para “interiorizar” um pouco o BE, que é uma força eminentemente urbana. Espero que não seja o primeiro deputado da “província” a ser eleito, mas que haja mais em Beja, Évora ou Bragança. O essencial é perceber que o fundamental é desenvolver o interior de forma a acabar com esta sangria, pois, cada vez mais, os melhores vão-se embora e o território tem menos gente, o que é uma pena, pois a qualidade de vida por cá é muito elevada.
P – Os interesses do distrito têm sido bem defendidos na Assembleia da República?
R – Não, nem sequer têm sido apresentados. mas isso tem a ver com a forma como os partidos do poder têm olhado para o interior. É um parente pobre, têm fechado escolas, serviços e retirado cada vez mais a capacidade de se desenvolver e se repovoar. De resto, os deputados do interior são meras figuras decorativas, estão lá simplesmente para votar e é quando lá estão. Queremos mostrar que o interior pode ser a safa deste país, porque temos este diamante que é a agricultura. Num país que importa quase 80 por cento do que comemos, este pormenor é muito importante para dar a volta à balança de pagamentos e à dívida que nos aflige.
P – O que acha da diminuição do número de deputados?
R – Não tenho nada contra, preocupa-me apenas a forma como a diminuição vai ser feita. Se método de Hondt já discrimina os partidos mais pequenos, fico muito preocupado com uma redução do número de deputados que, obviamente combinada pelos grandes partidos, vai reduzir ainda mais a representação dos partidos mais pequenos. Vai substituir a criatividade pelos “boys”. O problema não está no número de deputados, mas sim na sua qualidade, porque a maioria não presta.
P – Acredita que a crise atual será uma oportunidade para o desenvolvimento produtivo do distrito da Guarda, nomeadamente na agricultura, indústria e turismo?
R – Por um lado, acredito, porque a crise abre os olhos às pessoas e transforma sempre a sociedade. O que esta nos traz de bom é que revelou quem nos pôs nesta situação: foram as políticas seguidas nestes últimos anos pelos governos de PS e PSD.
P – O que é preciso fazer?
R – Primeiro que tudo é preciso regionalizar, depois temos que afastar este tipo de poderosos que dominam em lóbi a sociedade – que se nota muito mais no interior –, e a seguir as pessoas têm que se envolver mais na sociedade, na política. Por último, a esquerda deve preponderar sobre a direita – agora dando um lado romântico à coisa – porque apareceu primeiro e está do lado do coração. O crescimento da esquerda vai levar ao desenvolvimento, pois a esquerda olha para as pessoas e não para os números.
P – Mas no caso da agricultura, o que é preciso em concreto?
R – O BE tem defendido a criação do Banco de Terras, que vai mexer com a questão da propriedade, da divisão dos terrenos nesta região. Também devemos olhar para a agricultura como fizeram os espanhóis no final da Guerra Civil. Se o fizermos, constatamos que estamos erradíssimos, pois temos uma das zonas mais férteis do país e os entendidos dizem que poderíamos produzir aqui o melhor azeite do mundo e outros produtos de grande qualidade, como os vinhos.
P – Quais os principais projetos que tem para o distrito enquanto candidato a deputado?
R – É combater por esta esquerda moderna e fazer o que puder e não puder para fazer prevalecer o bom senso sobre o senso comum.
P – Depois de ter sido mandatário distrital de Fernando Nobre, sentiu-se traído quando soube da sua inclusão nas listas do PSD por Lisboa?
R – Não me senti traído porque as Presidenciais ocorreram em janeiro e só muito depois ele tomou essa decisão, pelo que não me arrependo de o ter apoiado. E volto a dizer que, para mim, Fernando Nobre era o melhor candidato à Presidência da República. Por causa dos abstencionistas, perdemos uma oportunidade enorme de termos em Belém uma pessoa de esquerda. Ele nunca deixaria o país ir para eleições nesta altura do campeonato, teria um comportamento humano, social e político muito diferente do atual Presidente. Agora, cada um segue o seu caminho.