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«É um livro de afetos, de vivências escolares e familiares»

Cara a Cara – Entrevista: Maria Alice Martins

P – Como surgiu a ideia para fazer este livro sobre recordações dos tempos da escola primária, enquanto aluna mas também como professora?

R – Este já é o quarto livro que escrevo, com contos e memórias. A ideia de o fazer surgiu depois do meu filho me pedir para escrever as histórias e cantigas que utilizava nas aulas para ensinar o “a e i o u” aos meus alunos na escola primária. Nessa altura só dava aulas a uma classe e tínhamos liberdade para ensinar como quiséssemos e eu gostava de os ensinar através de canções e poemas.

P – Como descreve esta obra?

R – É um livro de afetos, tenho cá retratados muitos dos meus alunos e, além disso, é dedicado a um filho. Esta obra tem uma primeira parte sobre como eu ensinava as primeiras letras, entre outras formas especiais de ensinar. Por exemplo, o poema que surge logo no início era aquele que costumava dizer aos alunos. Depois, falo também de recordações da minha antiga escola primária e dos lugares por onde passei enquanto professora. Há ainda alguns contos, pequenas histórias e episódios que acabo por contar à minha maneira. No fundo, é um livro de vivências escolares e familiares.

P – Que tipos de pesquisa faz para escrever os seus livros?

R – Os livros partem sobretudo de memórias, coisas que eu sei e que ainda não esqueci, embora a memória já falhe de vez em quando. Parte do material desta obra já estava recolhido na altura em que lançámos o penúltimo livro “Rebuçados para os nossos netos”, publicado há dois anos. Como a publicação fica um pouco dispendiosa, tornou-se necessário que este fosse mais pequeno, mas fi-lo de propósito depois do pedido do meu filho. Eu escrevo muito, mas guardo pouca coisa. Quem vai arquivando os versos, poemas, pequenos textos e recordações é o meu marido. Tenho, aliás, uma recolha com mais de 50 anos de ditados, anedotas, adivinhas e orações. É uma compilação a que eu chamo de “Filosofia Popular” e tem, por exemplo, memórias da corrida do galo que se fazia em Vila Franca das Naves e que mais ninguém tem. Por vezes, também tiro algumas ideias daqui para certas histórias.

P – Acredita que as novas gerações ainda têm interesse em conhecer estas história da região?

R – Penso que sim, porque se trata de literatura virada para os jovens e para quem não gosta muito de ler. Tenho uma amiga que nunca gostou de ler livros e, quando leu um dos meus, disse-me que não conseguiu deixar de o ler todo. Não é muito maçudo e os mais novos acabam por ler e isto desperta-lhes um pouco o interesse pela leitura.

P – Quais foram as principais dificuldades que enfrentou ao preparar o livro?

R – Escrever um livro é um prazer. Quando estou a escrever nada me incomoda, parece que nada mais interessa. O problema que surge é não ter apoios. Estes livros ficam muito caros, a Câmara de Trancoso ainda apoiou a publicação dos primeiros, mas nos seguintes já não tem sido assim.

P – Este livro “Às Voltas com o a e i o u” também transporta o leitor para algumas vivências do seu tempo de escola. Quais são as recordações que tem mais presentes dessa altura?

R – Eu fiz a primária numa escola linda, no Frechão. Gostava de tudo, das instalações, mas também do jardim. Lembro-me sobretudo do caminho que tinha de fazer até chegar lá, ainda eram alguns quilómetros. E não esqueço também algumas professoras. Andava há pouco tempo no primeiro ano quando a professora chamou os meus pais para lhes pedir que me deixassem continuar a estudar. E os meus pais, apesar de não serem ricos, fizeram sempre esse esforço, daí que tenha ido para a Guarda fazer o magistério, um curso que, na altura, dava acesso ao ensino.

P – Foi professora durante 30 anos. Como olha a escola de hoje?

R – Penso que falta alguma disciplina, porque agora muitos pais já não educam e muitos dos professores também não. No meu tempo, os alunos não estavam na escola amedrontados, mas também tinham de estar disciplinados. Muita coisa mudou, nomeadamente certas leis, porque, por exemplo, hoje, os professores já nem podem castigar os alunos.

P – Tenciona continuar a escrever e publicar livros?

R – Penso que vou ficar por aqui, porque financeiramente é muito dispendioso. Temos muitos amigos e acabamos por dar muitos livros em vez de vender. E agora com esta crise torna-se ainda mais complicado conseguir apoios.

Maria Alice Martins

«É um livro de afetos, de vivências
        escolares e familiares»

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