Ali na escuridão passeiam pessoas com tacões normais que ressoam muito por não haver ninguém. A noite é insegura por falta de companhia, ou há um medo intrínseco que nos desperta? A noite e a solidão levam-nos até à boca daquele vadio, que agora tem mais coragem porque está só, daqueles delinquentes – que agora se sentem muitos, daquele tipo que se move nela à vontade, pois nunca de lá sai. Há uma escuridão que é noite e outra é pensamento. Pode haver durante o dia noite dentro de nós. A noite é um escuro quebrado de néon, é uma lâmpada acesa no território da Lua, é um estranho silêncio que cai sobre a cidade, que amplia os gritos, que catapulta inseguranças. São argumentos de filmes de terror, são os castigos bíblicos, é a morte de Cristo ao crepúsculo, é a escuridão que associamos a tragédia, a frio, a chuva, a uivos e a dor. A noite é uma aventura adolescente e uma bebedeira sem razão. É um acidente por cansaço ou por alcoolismo. No fundo, usar a noite é utilizar um tempo de repouso, é transgredir com o descanso e talvez por isso seja aventura, seja história e seja romance. Tudo isto me surge com “After Dark”, de Haruki Murakami, que me sugeriram ler. E, no entanto, nada disto lá está. Um livro de ideias sobre pessoas, relações entre elas, fantasia colorindo personagens e um enredo que fica aberto. Há duas irmãs distantes que se aproximarão de modo inesperado, há uma antipatia que se torna enlace, há uma improvável tranquilidade numa noite que passa. Murakami aprende-se a gostar.
Por: Diogo Cabrita