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O novo IPE

Opinião

O país andou décadas para se livrar de uma coisa chamada Instituto de Participações do Estado (IPE), que era uma espécie de depósito do que foi restando das nacionalizações de 1975. Com essa mistura confusa os governos do bloco central, juntos ou separados, tentaram dar coerência empresarial onde ela não existia.

O IPE foi servindo como instrumento político através do qual o Estado mantinha uma intervenção espúria na economia e ao mesmo tempo garantia bons lugares a políticos desocupados e a gestores em permanente rodagem no sector público. Morreu de morte natural às mãos de João Talone, sem sobressaltos e sem que alguém tivesse vertido uma lágrima pelo defunto.

Há, no entanto, vícios que não se curam facilmente. É como deixar de fumar e experimentar um cigarrito tempos depois, na esperança de controlar o número de cigarros. A experiência mostra que ainda é pior. Pois é o que está a acontecer. O IPE está de volta, agora com outro nome. Chama-se Caixa Geral de Depósitos.

A Caixa, como é conhecida, tem uma vantagem em relação ao IPE. É um banco, um banco do Estado. Logo tem recursos para assumir, “sem complexos”, o “apoio a projectos do Governo” como, sem complexos, explicou o seu presidente Faria de Oliveira, um gestor que conhece bem a história do IPE. E é assim, sem complexos, que a Caixa é hoje muito mais do que um banco, concretizando a sua vocação de “braço armado do Estado” em operações de intervenção no sector empresarial que escapam às mais elementares regras de prudência da actividade bancária. A compra da participação de Manuel Fino na Cimpor é, apenas, mais uma das muitas decisões difíceis de entender.

Como é difícil de entender que a Caixa tenha financiado o mesmo empresário em mais de 500 milhões de euros para a compra de participações no BCP, na Soares da Costa e na já referida Cimpor. Como é difícil perceber que a Caixa registe menos-valias de 800 milhões de euros em participações na ZON, PT, EDP, BCP e Galp. Como é incompreensível que a Caixa sirva para tudo um pouco, funcionando como o bombeiro que o Governo usa para tentar apagar os fogos que a crise vai ateando.

Já se anuncia que a Caixa e a Parpública criarão em breve uma holding para onde passarão estas participações. Podem mesmo chamar-lhe IPE 2, para todos perceberem do que se trata. O país andará mais umas décadas para se livrar dessa tralha. Acabará mal, como aconteceu ao primeiro.

Por: Luís Marques

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