Outra verdadeira admiração no pavilhão de Angola foi a qualidade (a arte, o alcance…) da sua filatelia. Estou à vontade para dizê-lo, porque a filatelia portuguesa é de estupenda qualidade (lembre-se, v. g., a recente emissão de a Procissão em Veneza do demiurgo Nadir Afonso para o correio intra-europeu) e porque guardarei para sempre o melhor que me surge quando viajo pela Europa, aqui destacando o selo que me foi gentilmente oferecido há vários anos, em Bayreuth, para assinalar os 250 anos do teatro da ópera na cidade. A filatelia angolana que vi foi produzida pela AFINSA.
Além de ser a emanação da alma de um país, a filatelia, repito, é arte. E a alma de um país retrata-se no quotidiano com os seus altos e baixos, na Natureza com as suas maravilhas, no anelo do espiritual e na sua intangível preeminência…
Devastada por uma guerra fratricida, Angola fez muito bem em mostrar que há um corpo de bombeiros estruturado e que aos “soldados da paz” se deve toda a gratidão, homenagem; que há uma maravilha única no mundo cujo habitat é o deserto de Moçâmedes; e que tem suficiente categoria espiritual, para assim me exprimir, para ser visitada por alguém como o Papa (João Paulo II).
A maravilha do deserto de Moçâmedes é a Welwitschia mirabilis, essa singular planta que é já uma emoção em fotografia. Qualquer iniciado em Alemão intui que a primeira designação é germânica – e não se engana. Foi Frederico Welwitsch, botânico austríaco que veio para Lisboa em 1839, quem, ao fazer demoradas explorações em Angola, a encontrou. Já agora: as suas colecções no museu da Faculdade de Ciências de Lisboa estão devidamente salvaguardadas? Ou nesta república de sofismas e corrupção há dinheiro para estádios de futebol às moscas, mas não há para manter – como deve ser – o museu e o jardim da dita Faculdade?
A nível mundial, a potência com o mais cabal sistema de informações é… a Igreja Católica Romana. Angola avantaja-se de tal forma, no conspecto católico, a nível regional, continental e mundial, que Bento XVI já anunciou que a visitará. Chamo apenas a atenção para a profunda diferença idiossincrásica entre o actual papa e o seu “populista” antecessor.
O insigne Pedro Dias, a propósito da publicação da sua colecção de História da Arte a ser editada pelo Público, dizia há dias que «a publicação da colecção é uma gratidão por ter nascido português» (cito de cor). Estás cheio de razão, meu caro Pedro, cuja grandeza sempre recordo – e recordarei – desde o momento em que, não tendo dinheiro para levar uma mala grande de táxi até à Estação Velha, me levaste tu na tua Peugeot – 204 a gasóleo. Sim, por mil razões é emocionante ser português.
Quando às criancinhas se ensina que, para D. Henrique, toda a empresa das Descobertas fazia parte das cruzadas contra os muçulmanos e que os portugueses expandiam a Fé e o Império – que Camões assinalaria e ainda recentemente o jovem e ilustre egitaniense Marcos Farias Ferreira o disse, do cimo do seu saber, em dissertação de doutoramento (Cristãos & Pimenta, Almedina) –, quando às criancinhas se ensina… que o fixem para todo o sempre.
Claro que a missão teve o hediondo entrave do comércio de escravos; que os portugueses não têm o exclusivo desta hediondez; que o primeiro presente enviado por D. Afonso, rei do Congo, ao “rei seu primo” de Portugal era, precisamente, constituído por alguns escravos. Mas o Cristianismo ensina esta coisa excelsa: o perdão. E o perdão é a antítese do ressentimento, a única, absoluta, garantia de progresso (recorde-se Obama mais uma vez). É o Amor, absoluto, irrestrito.
Se o mundo em que vivemos não fosse dominado por uma tão avassaladora idiotia, se os políticos não fossem os ignorantes e embusteiros que são, a estas questões era dada maior atenção. Assim…
As fronteiras de Angola são uma criação portuguesa. Os angolanos são os nossos irmãos e estes laços afirmar-se-ão em perenidade. É nosso dever, é nosso imperativo. O padre Charles Duparquet, insigne espiritano, fundou em Lisboa (1866) um seminário de padres do Espírito Santo; e, a partir deste, originou-se a província portuguesa dos Espiritanos. Duparquet estabeleceu as fundações de dois centros missionários no Cubango e Cunene. À Huila (Sá da Bandeira para melhor situar quem precisar), em 1882, chegou o primeiro padre português, José Antunes, ao qual o bispo de Luanda, imediatamente, confia o seminário da diocese, transferindo-o para a cidade do planalto. Precisamente o melhor aluno e primeiro padre africano de então foi o padre Luís Barros da Silva, que recebeu ordens em 1895. Tendo-se juntado aos espiritanos e trabalhado como genuíno pastor no seminário, no orfanato e nas aldeias cristãs em volta, em 1931, quando faleceu, o povo chorou-o como se de um santo se tratasse. Às centenas de padres católicos que, em 1955, exerciam o seu múnus em Angola, juntaram-se, em 1957, os capuchinhos italianos; e o aumento das conversões era tal que a quantidade de fiéis era cada vez mais desproporcionada relativamente ao número de padres. E, em 1970, surge o primeiro bispo negro, monsenhor Eduardo Muaca. Precisamente nesse ano surge o primeiro manifesto da Igreja contra o colonialismo e, em 1975, os bispos portugueses resignam e são substituídos por bispos angolanos.
Dentro do novo espírito também a diocese egitaniense está presente: muito recentemente a Liga dos Servos de Jesus, fundada por D. João de Oliveira Matos, estabeleceu-se na Gabela (diocese do Sumbe, anteriormente Novo Redondo).
A longevidade do Cristianismo tornou-o elemento integrante da identidade nacional angolana, mormente na sua versão católica. Os graves erros do marxismo superar-se-ão pela conversão de José Eduardo dos Santos; e a unidade nacional angolana é um corolário da idiossincrasia portuguesa (o império espanhol esfrangalhou-se na América do Sul e do Norte, mas o Brasil sempre foi e será uno).
Seja-me consentido dizer aqui que espero ver a visita de Bento XVI igualmente consagrada na filatelia. Deus abençoe Angola que, por aqui, também está salva.
Guarda, 9 – XI – 08
Por: J. A. Alves Ambrósio