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Pensar as ruas do centro histórico

As obras de repavimentação que estão a avançar no Centro Histórico da Guarda vão envolver mais do que substituir uma época de pavimento por outra.

As obras vão evitar, claro, as grandes lajes de granito utilizado na Praça Velha e antes, na entrada da Porta da Erva. Aquela lição não precisa de ser repetida. Como O INTERIOR já noticiou, a intenção é utilizar as mesmas pedras pequenas aplicadas pelo PolisGuarda, «de forma a uniformizar a imagem das ruas do centro histórico».

Certo, há bons exemplos como a Rua do Comércio e as Ruas da Paz e do Torreão, que já mostraram o que é possível com a pedra clássica. As lajes estreitas e centrais, como as usadas nessas ruas, são elegantes; criam direcção e unidade, ajudam a drenagem e são simpáticas para um carrinho de bebé.

A vantagem secular das pedras pequenas (ainda no século XXI) é que se pode construir um passeio ou calçada em espaços complicados e pequenos e com pouca maquinaria. Mais tarde, pode-se reabrir, escavar e fechar a mesma, sem deixar cicatrizes: a sofisticação do simples.

Mas julgo que as soluções devem ser diferentes para algumas das nossas ruas e espaços: quer nos materiais, quer nos desenhos. Estas obras são bem vindas, claro. Trata-se de um grande passo em frente para os serviços da PT, EDP e o saneamento. Mas julgo que a pavimentação deve ser repensada durante o ano (ou mais) que durarem as obras.

Construímos para o futuro: pouca população em 2008, sim, mas se conseguimos revitalizar o nosso centro, teremos mais gente e muito mais movimento no futuro do que vemos agora.

Algumas destas ruas têm comércio, outras só casas particulares e outras muito trânsito. Muito importante vai ser a Rua de São Vicente, que liga as duas portas antigas, e que passa pela igreja do mesmo nome. Devido ao muito trânsito automóvel e pedonal, esta rua precisa de um pavimento elegante e forte, apto a servir centenas de carros, mas também senhoras com sapatos leves.

Tijolos de cimento colorido e barra sobrevivem a milhares de veículos sem fissurar, escurecendo melhor do que granito. Tijolos em bandas são uma boa escolha para muitos fins, como o estacionamento na Avenida dos Bombeiros.

A actual Rua São Vicente está pouco agradável para o peão e a solução escolhida tem que ser bem pensada, pelo que será uma peça chave para o Centro Histórico.

Desta vez é essencial envolver mais o público, que deve ter a oportunidade de ver uns exemplos construídos das soluções pretendidas. Por causa do automóvel particular, é cada vez mais difícil gerir espaços históricos tão pequenos como os “mini-largos” da Judiaria ou o Largo do Passo do Biu.

Este último serve, simultaneamente, como praceta, como rua e como estacionamento, com um só tipo de pavimento mal definido para todos estes fins. Entretanto, faz parte da ligação da Porta da Erva à Porta del Rei.

Que o espaço é triste e lhe falta carácter, não deve ser surpresa. A quem pertence?

O Largo do Passo do Biu deve ser replaneado. Precisa de pavimentação diferente para as ligações à Rua do Torreão e à Rua D. Sancho, o resto terá que ter outro tipo de superfície. E precisa de uma «micro-gestão», que a câmara não pode (não deve) oferecer. Uma solução mista seria arrendar o espaço que resta aos moradores, para quem pode ter um real valor. Com pequenas árvores, bancos e espaços definidos para (alguns) carros, o espaço podia ter charme e carácter próprio.

A pavimentação é, afinal, feita à mão. Então, em cada rua e largo, a pergunta deve ser: Que espaço é este? E como funciona?

Por: Rory Birkby, urbanista e fotógrafo de arquitectura. Sul-africano, tem casa no centro histórico desde 1987.

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