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Da Alemanha (VII)

Porque o ressentimento mata – e, antes de mais, ao próprio que o sente e/ou cultiva – é que a postura de Grass – a despeito, claro, das suas melhores intenções – é uma inenarrável catástrofe. Interiorize-se sempre bem que o ressentimento é a antitese do perdão.

Isto tem que dizer-se com inexprimível pudor, mas também com instante urgência, porque intelectuais alemães, do cientista ao cineasta e ao pintor, pelos vistos ainda lá não chegaram. E a Alemanha vê-se, assim, abandonada por alguns dos seus filhos mais capazes. Não é de nacionalismo que aqui se trata, claro.

Isto é: se há algo extremamente difícil é a interpretação da História. Recordem-se, mais uma vez, as palavras de Hannah Arendt (“contar de novo velhas histórias é bom e importante”). E a Alemanha tem que fazer progressos absolutos nesse sentido – a Alemanha e todos os demais. Já agora.

A Documenta é um dos maiores certames mundiais de arte contemporânea; e realiza-se em Cassel, de cinco em cinco anos, durante cem dias. Na última, em Agosto transacto, já não recordo se numa instalação, ou a propósito de fotografia, a dada altura, remetia-se para a conferência de Berlim (XI-1884 a II-1885), a qual, como se sabe, fez a partilha do mundo pelas grandes potências. A remissão, todavia, era um anacronismo extremamente grave – e ao autor do texto não passa (va) pela cabeça o que seja (fosse) alteridade.

Mais. Talvez, mesmo, ignore a mais elementar história europeia dos finais do século XIX, a singular penetração de Bismarque no que à expansão ultramarina tocava (repudiava-a), mas como a criação de uma marinha de guerra era a “menina dos olhos” do Kaiser [imperador] e, por outro lado, como o povo também olhava entusiasmado para tal expansão. A Documenta-2007 (12ª. edição), nos antípodas da alteridade, projecta-se. (Muitos artistas não são profundos de pensamento). Todavia, é o mesmo erro que o modesto empregado de uma área de serviços na zona da Floresta Negra comete.

Com efeito, este, por eu lhe ter dito que era português, criticou acerbamente o colonialismo português. Sucede que também a Espanha e a Holanda tiveram colónias desde o século XVI; e que a colonialização portuguesa pecou, sabe-se – mas não tanto como a inglesa, com seus genocídios e racismo, nem, na guerra, algum dia fez o que os franceses fizeram na Argélia.

Aqueles que julgam que o ser humano é de muito fácil “leitura” é porque nada sabem acerca de si próprios – para não os remeter já para o conhecimento da grandeza dos primeiros filósofos gregos (estritamente os cosmocêntricos, “físicos”).

Sabe-se. O Tratado de Versailhes continha em si os germes mais venenosos; e essa república de intelectuais que foi Veimar fez o que se sabe. O nazismo é uma inenarrável monstruosidade, mas por que ser motivo de permanente mortificação?! Perdoar-se a si mesmo e, com absoluta fé, visualizar o futuro – e não há outra hipótese.

É evidente que há 2 critérios-chave para suplantar tão inditosa situação: primeiro, inocular numa comunidade inteira a superação da projecção pela alteridade; segundo, a preeminência do perdão. Para me exprimir com o possível rigor, direi que são tarefas ciclópicas.

Sem saber não é possível viver-se, mas, desde logo, às crianças não é possível inocular-se tão denso saber, porque a generalidade dos adultos também… não o possui. Pôr-se na pele dos outros postula uma irrenunciável humildade – e tal saber é múnus, tem o seu habitat na cátedra universitária. Desde logo, outro problema. Com efeito, mesmo que a universidade seja de excelência, quantos, nela, se situam na área das Humanidades? A Alemanha tem mais que categoria para se vencer, vencer os seus fantasmas – Dá disso sinais e sobre tal não haja qualquer dúvida. Mais. Na Universidade alemã há faculdades de Teologia (falo de faculdades, porque existe a Católica e a Luterana).

Nesta tarefa devem, já se vê, estar igualmente envolvidas as Igrejas (Luterana e Católica).

Contudo, tal como é difícil ensinar a humildade da alteridade, um sentido progresso para uma vida e a perenidade, não menos difícil é ensinar a preeminência do perdão. Porque não há quaisquer ilusões: se as Igrejas se reclamam do Divino, o certo é que os seus agentes são seres humanos. Ou seja: nunca confundir doutrina com ensinamento da doutrina e/ou prática da doutrina.

Pois não basta olhar à nossa volta?

De certeza segura uma conclusão: a resolução dos problemas humanos situa-se apenas no domínio do…religioso. Melhor. Do estritamente religioso.

Para os timoratos há, porém, que ser explícito: não se trata do sobre-humano – mas também não é “pêra doce”. Explico-me melhor: “A fé é trans-racional; está para além da razão, mas sem a negar”. A afirmação é de alguém que, no seu tempo, foi considerado um visionário. Teilhard de Chardin, precisamente. Curvo-me perante a elevação do jesuíta francês.

2-XII-07

Por: J. A. Alves Ambrósio

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