Heróis com defeitos e vilões em redenção

Escrito por Pedro Fonseca

Precisamos de heróis e de vilões como de pão para a boca. Tamanha é essa necessidade que os vamos buscar à vida real e à ficção, ao presente e ao passado. Os contos de infância são a porta de entrada para a lógica das narrativas dos “bons” e dos “maus”. Daí em diante, a adição a heróis e vilões vai sendo continuamente reforçada e, aos poucos, essas referências do bem e do mal vão ajudando a nortear a nossa conduta diária e a avaliar a dos outros. No entanto, este tipo de mundovisão está crivada de contradições e destinada a gerar dilemas.
Winston Churchill é celebrado como um herói pela sua liderança na resistência à Alemanha nazi durante a Segunda Guerra Mundial. Pela mesma altura, o mesmo Churchill teve responsabilidades na “fome de Bengal”, que dizimou cerca de 3 milhões de pessoas na Índia, e, pouco depois não hesitou em recorrer a métodos de extrema violência para esmagar uma insurreição contra o domínio colonial britânico no Quénia.
Um bem (tido como) maior pode compensar certos males (tidos como) menores? Devemos omitir ou desvalorizar estas dimensões menos positivas? Deixar de o celebrar? Derrubar as suas estátuas? Reescrever os manuais da história? Retirar o seu nome a ruas e praças?
Pablo Escobar é recordado como um dos maiores vilões do século XX pela quantidade de crimes de violência extrema que cometeu. Durante esse período, o mesmo Escobar construiu hospitais, escolas, casas e estádios de futebol para os mais desfavorecidos, passando a ser visto como uma espécie de “Robin dos Bosques” pelas populações que beneficiou.
Algumas ações positivas podem servir de compensação ou atenuantes para ações negativas? Devemos desvalorizar estas ações nos seus relatos biográficos? Deixar de o condenar de forma tão veemente pelos crimes que cometeu? Atribuir o seu nome a alguns dos hospitais ou estádios que erigiu?
Lidar com este tipo de questões é uma consequência direta de se olhar para a história como uma longa narrativa povoada por heróis e vilões. Talvez, afinal, também gostemos tanto da divisão entre “bons” e “maus” porque ver o mundo a preto e branco é mais simples do que vê-lo através da totalidade das suas cores. No entanto, “simples” e “correto” não são sinónimos e é no espaço entre o preto e o branco que se encontram todas as outras cores.

* pedrorgfonseca@gmail.com

Sobre o autor

Pedro Fonseca

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