A Caixa Geral de Depósitos
Fazemos saber a todos os nossos súbditos, que as côrtes geraes decretaram, e nós queremos a lei seguinte: Artigo 1.º É creada uma caixa geral de depositos, que será administrada, nos termos desta lei, pela junta do crédito publico.
Foi assim, através da Carta de Lei de 10 de abril de 1876, promulgada pelo rei D. Luís, que foi criada a Caixa Geral de Depósitos.
Um dos seus objetivos era criar balcões nas capitais de distrito, mas irá demorar dezenas de anos a concretizar. No distrito da Guarda chegaram a ser 17 agências, mas o movimento de abertura inverteu-se, e algumas, contra a vontade do povo, já ficaram pelo caminho.
Um banco numa igreja
No início do séc. XX o concelho da Guarda contava 41.517 habitantes e a cidade 6.197. Não havia agências bancárias comerciais mas havia correspondentes e agentes dos principais bancos. Destacavam-se, nessa altura, António Marques da Cunha Mantas, Augusto Pissarra e Fernando António Patrício, mas outros virão.
Em princípios de 1920 o diretor de Finanças da Guarda tem conhecimento da intenção de a Caixa instalar uma filial na cidade. De imediato, comunica à administração da Caixa Geral de Depósitos que havia na cidade um edifício devoluto e apropriado para esse fim. Ficava localizado na rua Alves Roçadas, a zona mais central da cidade, entre o antigo Paço Episcopal e o Seminário.
Tinha sido confiscado à diocese em 1911, após a implantação da República, e estava sob a administração da Comissão Central de Execução da Lei de Separação do Estado da Igreja.
Mas como a renda pedida, 300$00/mês, fosse considerada demasiado elevada, foi decido proceder à aquisição do edifício, o que veio a acontecer através do decreto nº 6.771 de 10 de Julho de 1920, sob proposta do Ministério da Justiça e dos Cultos.
É assim que o edifício da capela do antigo Paço Episcopal e Seminário da Guarda, incluindo uma parte do terreno anexo à fachada posterior, passa para a Caixa, pela verba de 6.000$00.
Depois de feitas as devidas obras de adaptação, a Filial da Guarda foi inaugurada a 4 de Maio de 1921.
O edifício era grande, tinha dois pisos, mas apenas foram ocupados alguns compartimentos do r/c.
A ligação entre os dois pisos era feita por uma escada, iluminada por uma janela alta da qual se tinha vista para o pátio do Paço Episcopal, o mesmo que dava acesso à entrada de diversos estabelecimentos públicos.
Mais tarde, em 1924, o 1º piso foi cedido à Junta Geral do Distrito da Guarda para instalação dos seus serviços. Mas como em 1940 estava devoluto foi cedido à Câmara Municipal da Guarda para instalar o Museu etnográfico.
Novas instalações
As instalações da Caixa eram manifestamente deficientes, entalado entre o Quartel do 2º Grupo de Metralhadoras e a Direção de Finanças, daí que em 1936 o Conselho de Administração resolveu construir um edifício de raiz. Assim, em 1937, depois de muitas negociações, a Câmara Municipal da Guarda cedeu à Caixa uma faixa de terreno para a construção da Filial, recebendo em troca o edifício onde então se encontrava a funcionar.
O terreno era um gaveto delimitado pela Rua Vasco da Gama e pela Rua Mouzinho da Silveira, junto da igreja da Misericórdia, pelo que também teve que ser negociada a cedência de um anexo pertença da Santa Casa da Misericórdia. Foi nessa altura que as sentinas púbicas que ali havia, e tanta polémica tinham gerado, foram demolidas. O autor do projeto foi o conceituado arquiteto Luís Cristino da Silva. Dele sobressai a torre sineira e um relógio cujo acesso se faz pelo exterior, através de uma escada que partia do terraço da residência do gerente.
A empreitada de construção foi adjudicada à firma José Alves dos Reis & Cª, pela quantia de 837.000$00, e o contrato assinado a 27 de Julho de 1939. Tinha como obras de referência o Edifício dos Correios de Santarém, o Instituto Superior de Agronomia, o Bairro Social do Arco Cego, entre outros. O contrato previa a conclusão dos trabalhos em 300 dias a contar da data do contrato.
Em 1941 o Conselho de Administração da CGD resolve adjudicar ao mesmo José Alves Reis os trabalhos de transformação do remate da torre do edifício, com vista a imprimir-lhe maior estabilidade e resistência aos ventos. Ao mesmo tempo que os trabalhos iam decorrendo, com alguns constrangimentos devido à natureza do solo e à grande quantidade de água no subsolo, foi encomendada ao artista António Cristino da Silva a decoração mural da sala destinada ao público. Terminada em novembro de 1939, é uma pequena maravilha, digna de registo.
As novas instalações foram inauguradas a 10 de Agosto de 1942, e segundo o jornal “A Guarda” era um edifício de linhas sóbrias mas elegantes “… é interiormente de harmonia de técnica e de arte, de sobriedade e distinção …”.
O prestigioso Club Egitaniense
Mas o tempo é inexorável, como tudo na vida, e passados 30 anos o edifício já não satisfazia as necessidades a que os serviços obrigavam. Assim, sem surpresa, nos anos 70 voltou-se a pensar numa nova construção para responder aos novos desafios e interesses dos clientes. Em 1979 o Conselho de Administração da CGD adquire o terreno onde se encontrava instalado o já velho e prestigioso Club Egitaniense, na rua Marquês de Pombal. Com a área de 2 100 m2, ficava logo ao lado do belo edifício do Banco de Portugal.
As obras começaram em dezembro de 1988, e ficaram concluídas em finais de 1990.
É um edifício moderno e funcional que continua a cumprir a missão para qual foi projetado.
O Museu de Arte Sacra
A velha igreja, assim como o Paço e o Seminário, nunca deixou de ser reclamada pela Diocese da Guarda. A devolução custou, demorou décadas a ser feita, mas depois por lá passaram os Escuteiros e a Acção Católica. Por ora, a vetusta igreja, que chegou a ser destinada a Tribunal Judicial, e depois passou a agência bancária, está transformada num moderno espaço polivalente que aloja o Museu de Arte Sacra da Diocese da Guarda.
*Investigador da história local e regional