Há 117 anos era inaugurado o Sanatório Sousa Martins, à data, a maior, mais evoluída e moderna instituição de saúde nacional na luta contra a tuberculose e uma das melhores da Europa nessa vertente.
Pese embora o tempo e os recursos serem outros, houve a visão, coragem e determinação para instalar na Guarda um equipamento público de referência, diferenciado e com um investimento significativo. O legado histórico edificado ainda hoje perdura, infelizmente bastante degradado, mas com uma resiliência desafiadora ímpar, clamando pela sua urgente reabilitação.
A área da saúde na Guarda, para além de toda a tradição ancestral nesta matéria, constitui-se sem dúvida como um vector de desenvolvimento estratégico e potenciador da dinâmica económica e demográfica do território. A Guarda, seja nesta área ou em muitas outras, tem de começar a pensar fora do seu espaço, aproveitando as potencialidades geoestratégicas e rodoferroviárias que possui.
Desde já, pugnar para num futuro a médio prazo chamar a si o estatuto de Hospital Central, num território que vai de Castelo Branco a Bragança, sendo a Guarda o ponto central deste eixo. Tal como actualmente sucede, sempre que as condições clínicas assim o exigem ou a insuficiência de meios obriga, muitos utentes são referenciados para Coimbra, o Hospital Central de referência na região, a quase duas horas de distância. O mesmo sucede com Castelo Branco, cuja viagem para Coimbra será até um pouco mais demorada. Por outro lado, de Bragança ao Porto são também mais de duas horas. Em todos estes casos acresce a morosidade de tráfego na entrada daquelas áreas urbanas, o que faz dilatar ainda mais os tempos de deslocação.
A criação de um Hospital Central na Guarda para onde convergissem todos os utentes das regiões descritas, para além de aliviar os hospitais de Coimbra e Porto, já de si a trabalhar no limite da sua capacidade, possibilitaria a atracção de novos profissionais clínicos que estariam dispostos a aproveitar uma oportunidade única em termos de carreira, mas também a usufruir da qualidade de vida que só uma cidade média de montanha pode e sabe oferecer.
Para este desígnio estar completo outro vector deveria também ser trabalhado, designadamente a atribuição do estatuto de Hospital Universitário ao Sousa Martins, tal como já acontece com o Pêro da Covilhã.
Lembremo-nos que em termos de ensino prático, a Guarda recebe um maior número de alunos no seu hospital do que a Covilhã, apesar de esta ter um estatuto superior na hierarquia administrativa da saúde. Lembremo-nos também que a Faculdade de Medicina só existe na UBI porque a cerca de 40 quilómetros existe o Hospital da Guarda que a complementa.
A Guarda não quer, não deve e nem precisa apoucar a sua vizinha do sul para sobressair. Deve sim aproveitar as suas potencialidades e reclamar como seus estatutos e atribuições que agora lhe escapam, mas que num futuro próximo serão determinantes para o seu sucesso. Precisa-se, contudo, de muito trabalho para que essa visão se concretize e para isso é de uma necessidade imperiosa que a ULS, o IPG e a Câmara tenham uma visão conjunta para o território e, em uníssono, reclamem em bloco junto do poder central as reivindicações que uma Guarda com estratégia exige.
* O autor escreve ao abrigo dos antigos critérios ortográficos