Os interesses da comunidade são preteridos

Escrito por Honorato Robalo

“Não podemos ser capturados por interesses partidários ocultos que servem para colocar em causa a justa luta política e partidária pelas genuínas propostas que cada um defenda para o bem coletivo. Já referi anteriormente que a luta pelas causas nobres do nosso quotidiano existencial é aproveitada por alguns.”

Nada é inocente no chumbo de propostas, inclusive do orçamento municipal da Guarda, melhor, da falta de planeamento estratégico de quem executa e também das constituídas oposições. Saliento que foram os dois partidos políticos, PS e PSD, com o apoio do CDS, que impuseram limitações à autonomia do poder local, em meu entender como medida para limitar a gestão autárquica comunista, mas esqueceram-se que estavam a afetar as populações, daí que tenham todos responsabilidades acrescidas na perspetiva de construir soluções em convergência. Os munícipes da Guarda assim o decidiram: gestão autárquica em minoria, o que implica que os eleitos não se mantenham “atados” a jogadas políticas, saliento que o atual presidente do município da Guarda foi vereador do PSD em coligação com o CDS e depois numa maioria absoluta do PSD, daí entre parceiros partidários e companheiros de percurso, alguns nunca deixaram de estar presentes na sombra, os mesmos tem contribuído para não haver saídas para resolução dos nossos problemas.
Não podemos ser capturados por interesses partidários ocultos que servem para colocar em causa a justa luta política e partidária pelas genuínas propostas que cada um defenda para o bem coletivo. Já referi anteriormente que a luta pelas causas nobres do nosso quotidiano existencial é aproveitada por alguns.
É fundamental que haja sempre transparência política nos posicionamentos, mesmo que sejam contrários, não apareçam na sua defesa quando e só as circunstâncias de eminente crise ou ruptura, quando na realidade decisões políticas e posicionamentos partidários colocaram em causa a resposta às necessidades das populações, nomeadamente nos diversos serviços públicos.
Efetivamente, a não aprovação do orçamento municipal da Guarda e de mais medidas apresentadas pelo PG traduz dificuldades mais profundas na gestão autárquica. Os sete vereadores do executivo (3 PG, 3 PSD e 1 PS) têm o dever de utilizar todas as ferramentas da democracia representativa para construir propostas que aproximem posições, naturalmente não refiro as que ideologicamente determinam as diferenças de modelo de gestão autárquica, infelizmente, nesse campo não as têm, pois são os mesmos que convergem para castrar a autonomia do poder local, utilizam diversas armas e as circunstâncias para preterirem os nossos interesses, enquanto comunidade.
Não esquecer que muitas das dificuldades nas acessibilidades, na educação, nos transportes públicos, na saúde, na habitação, na cultura, na gestão da água, entre outras, resulta da desresponsabilização do poder central, no concreto decisões do PS/PSD/CDS determinam, concomitantemente com o PG/PSD/PS/CDS no poder local da Guarda, o paulatino abandono do mundo rural com encerramento das escolas do 1º Ciclo, a não implementação em toda a rede pública das refeições e CAF, apregoavam com a criação dos centros escolares que resolviam esses e outros problemas, tal não aconteceu e alguns já estão subaproveitados em consequência do encerramento de empresas e destruição da indústria.
Recordam-se da discussão em torno da Estrada Verde? Recordam-se da ligação da A23 a Manteigas e Sabugal? Muitas outras promessas poderia enumerar, mas preocupa-me que os eleitos municipais do PG, do PSD e, no passado recente, do PS se apressem a colar às reduzidas propostas do poder central para a revitalização económica do concelho. Efetivamente o que está em causa é a subordinação do poder político ao poder económico: exemplo claro é a retirada de competências relativas ao terminal ferroviário da Guarda da Infraestruturas de Portugal para a Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo. Pelos vistos, o privado esperava “mamar” dos fundos comunitários para implementar a obra. Trata-se de mais um caso de submissão dos interesses nacionais e da região aos interesses privados, bem como de desarticulação da ferrovia portuguesa. O terminal ferroviário da Guarda, com a necessidade de ligação à PLIE, tem que ser um investimento público a bem da comunidade e do desenvolvimento da região. Estas e outras obras, todas elas da responsabilidade da Infraestruturas de Portugal, urgem.
O PCP foi único partido político a exigir a reversão desta cedência de um bem de domínio público, a reintegração de todos os trabalhadores, sem perda de direitos, e a defesa da ferrovia nacional. Quanto aos eleitos municipais da Guarda deveriam estar na primeira linha de exigência ao poder central do necessário e urgente investimento de ligação ferroviária à PLIE, esta complementar à requalificação da Linha da Beira Alta e em correlação com a Concordância das Beiras (Beira Baixa e Beira Alta).
Não esquecer que o PCP sempre foi contrário à subtração de competências do poder local, mas também à entrega de competências adstritas das funções sociais do Estado. Recordo que o PCP se opôs à criação de sistemas que integrem todo o ciclo da água, desde a captação à entrega aos munícipes, como o que foi proposto no acordo de parceria para criar a Águas Públicas em Altitude (APAL) – Serviços Intermunicipalizados, entre os municípios de Celorico da Beira, Guarda, Manteigas e Sabugal. Estas opções favorecem uma futura privatização, retiram competências municipais e diminuem o controlo democrático da gestão da água. As Câmaras deveriam manter a gestão da entrega de água, mesmo criando uma empresa para gerir a captação.
Neste sentido, o folhetim político dos três (PG/ PSD/ PS) em relação ao processo acessório do Conselho de Administração da APAL relevou mais que a proposta convergente entre eles no modelo de gestão, este sim que deveria merecer reflexão, tal como acontece no modelo de gestão na habitação, na cultura, educação e outras áreas.
Como em anteriores processos será sempre um passo a mais no caminho da privatização ou concessão ao privado, tal recurso tem onerado o erário público com prejuízo nas respostas, bom exemplo a recolha do lixo pelo privado, ou seja, com parcerias privadas destruímos os serviços públicos e reduz-se a oferta para aumentar o lucro, o exemplo bem claro é a privatização do transporte público de passageiros.

* Membro da Direção da Organização Regional da Guarda (DORG) do PCP

Sobre o autor

Honorato Robalo

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