O blogue Geração Rasca (http://geracao-rasca.blogspot.com/2006/11/as-minhas-escolhas.html) está a promover um escrutínio para nomeação dos melhores blogues portugueses de 2006. Uma espécie de Óscares informais em que os bloguistas escolhem, de entre os seus pares, os que mais se distinguiram nas respectivas categorias. O regulamento poderá ser consultado no mesmo endereço. Os resultados serão anunciados a 10 de Dezembro.
Já consultei várias votações publicadas pelos seus autores. Ora, tenho por hábito observar a máxima de que gostos não se discutem. Mais importante ainda, por norma, não confundo o bom gosto – onde o reconheço – com o meu gosto. Veja-se o caso do Bomba Inteligente (http://bomba-inteligente.blogspot.com), uma referência consensual na blogosfera – traduzida nas votações – mas que, todavia, não faz parte das minhas afinidades electivas. Talvez porque a verdadeira beleza não se anuncia sem uma imperfeição. Algo dificilmente detectável naquele blogue. Que mantenho nos links enquanto padrão de inspiração apolínea, mas não, digamos, dionísica. Por outro lado, tenho descoberto blogues onde a sofisticação dá lugar à discrição, a um singular e despretensioso programa desenrolado pelo autor, onde a naturalidade pesa mais do que o artifício. Os exemplos podiam multiplicar-se… Todavia, para já, torna-se curial questionar a oportunidade e a relevância desta iniciativa:
1. Desde logo, o facto de qualquer cidadão registado num servidor de blogues poder votar, assegura, em tese, uma abrangência e democraticidade na blogosfera, capazes de alargar o interesse por blogues situados à margem da “aristocracia” dos 10% inventariada por JPP no Abrupto. O endereço é: http://abrupto.blogspot.com/2006_11_01_abrupto_archive.html #116317188002493352 No seguimento do “caso” Miguel Sousa Tavares, e a propósito dos que tendem a encarar a blogosfera como o quintal das traseiras do jornalismo “sério”, o historiador estabelece uma ratio de 10% /90%, entre o “luxo” e o “lixo” da blogosfera. Sendo que esta realiza plenamente o acesso das “massas” ao espaço público, e uma espécie de igualitarismo nas margens dos discursos oficiais, mediante uma identidade construída no ciberespaço. Os bloguistas como pioneiros de um novo tempo.
No entanto, tenho algumas dúvidas de que esta votação, tal como é feita, avalize o mérito das escolhas realizadas. Mais sensato é encará-la como mero indicador, com o valor de uma sondagem, sujeita às flutuações e à precaridade do gosto. Mais credível se afigura a nomeação dos Bob Awards, uma iniciativa promovida por uma rádio independente alemã, onde vários blogues lusos já foram distinguidos.
2. Por outro lado, é bom não esquecer que a blogosfera é um universo descentralizado, inorgânico, horizontal, a concretização da Teia, da contra-rede, prevista por Hakim Bey no seu e-book Temporary Autonomous Zone. A ciberedição, por enquanto, escapa ao controle dos grupos editoriais, às instâncias homologadoras. Estabelece novas fronteiras para a liberdade de expressão e de informação. É natural pois que, neste depósito intersubjectivo, se estabeleçam determinados códigos, determinadas práticas. E que o anonimato proporcionado pelo meio não signifique impunidade, estando em causa a ofensa a bens juridicamente protegidos. Os actuais mecanismos legais terão que ser aperfeiçoados neste domínio. Mas dever-se-ia ficar aí. Seria tentador ir mais além, fixar padrões ao nível dos conteúdos, sejam eles de que ordem forem. Contudo, não tenho dúvidas de que esse caminho, para além de ilegítimo, não se faria sem prejuízo da liberdade e da fluidez da blogosfera. A este propósito, em http://kontraste.wordpress.com/files/2006/11/qualidade-blogues.pdf há quem defenda o estabelecimento de um “comité informal” para atribuir uma “certificação de qualidade” aos blogues. Como se a qualidade de um blogue dependesse de um selo e não dos mesmo critérios com que julgamos qualquer objecto artístico, qualquer publicação, qualquer acto comunicacional! É claro que a intenção de João Ferreira Dias é compreensível. Mas, a concretizar-se, poderia ser o início de uma espiral regulamentadora com consequências devastadoras.
3. Por último, e na sequência do que atrás se disse, a maior ou menor popularidade de um blogue, o facto de se tornar uma referência, ou um fenómeno de culto, advém de determinadas predisposições, criadas graças à exposição à blogosfera e aos media em geral, que condicionam fortemente a consulta regular de um determinado blogue. Anteriores aquelas – conjunturais – existem outros factores – estes estruturais – que determinam a procura e a “eleição” de certos blogues. Como exemplos, a informação especializada, a polémica localizada, o registo intimista, a proximidade geográfica ou de outra ordem com o/a autor/a, a paixão clubista, a partilha de gostos, as curiosidades, etc. Por outro lado, há ainda critérios de ordem formal e que, só por si, poderão fazer cair nas boas graças de alguém determinado blogue: o ritmo das postagens, como assinala Carla Quevedo, a maior ou menor especialização do blogue, o grafismo, a existência ou não de comentários e o seu número, entre outros.
Por: António Godinho