Cara a Cara

«Se esta região está a prazo, então as metrópoles também estarão»

Cara
Escrito por Efigénia Marques

P – Como surgiu e o que é A Geradora – Cooperativa Integral, sediada na aldeia da Broca (Trancoso)?
R – A Geradora surgiu da vontade de 22 cooperadoras/es em criar uma estrutura onde as mulheres rurais se sintam bem-vindas e valorizadas pelo imenso trabalho que todos os dias fazem no nosso território, muitas vezes trabalho invisível e sem valor de mercado. A Geradora é uma cooperativa integral com 7 ramos: cultura, serviços, consumo, agrícola, solidariedade social, habitação & construção e comercialização de forma a dinamizar a vida comunitária integrada com a participação ativa das/os habitantes pela arte, cultura e ambiente através da investigação-ação.

P – Porquê a escolha da Broca?
R – A Broca é uma aldeia praticamente abandonada, atualmente tem seis habitantes permanentes. Queremos chamar a atenção para o abandono dos nossos territórios pelo Governo central e promover a sua inclusão no discurso e nas políticas públicas. Territórios que alimentam as metrópoles de Lisboa e Porto, que fornecem água e eletricidade através das bacias hidrográficas do Mondego e do Douro, que fornecem oxigénio enquanto tivermos árvores e florestas autóctones… Outro dos motivos é que a Broca está muito bem situada para aí conseguirmos juntar as pessoas das aldeias de ambos os lados da Serra da Broca, e de outras partes do país e do mundo, como aconteceu este domingo no festival “Broca Viva”.

P – Num cenário generalizado de despovoamento e envelhecimento, esta região não estará a prazo?
R – Se esta região está a prazo, então as metrópoles também estarão. Não há metrópoles sem zonas rurais sustentáveis. Os habitantes da metrópole não vivem sem nós, precisam de alimentos de qualidade, de água potável, de ar puro das florestas autóctones, de abelhas saudáveis, de eletricidade…

P – Ainda é possível reverter este cenário? Como?
R – Sim é. Criando condições para as pessoas que estão a sufocar nas grandes cidades se possam aqui instalar, por exemplo:
– Casas nas aldeias prontas a arrendar;
– Apoios à mobilidade dentro território e abolir as portagens da A25 e A23 (há milhões do Orçamento de Estado para os transportes públicos das metrópoles e bem, contudo nós pagamos os mesmos impostos que as pessoas que usufruem deles e não temos apoios às deslocações), o mesmo se aplica ao Serviço Nacional de Saúde, IEFP, etc.
– Passe cultura e ambiente intermunicípios que permita descontos em combustível para carros partilhados. Viver no interior torna-se caro pelas deslocações que temos de fazer para ir a um hospital público, para ir a um evento cultural, para fruir do património edificado e natural magnífico do território;
– Mecanismos de apoio prático e acessível para que as Organizações Não Governamentais sem fins lucrativos possam continuar a fazer um trabalho de proximidade, mas mais frequente e com menos voluntariado, pois este trabalho é essencial para a vida das comunidades locais e da conservação do território;
– Incentivos para que pessoas que possuam casas desabitadas e terrenos agrícolas abandonados os coloquem no mercado;
– Proporcionar condições aos refugiados à chegada a Portugal nos territórios do interior;
– Facilitar a instalação de novas/os empresárias/os no território;
– Apoios não só para os que vivem fora e se mudam para o interior, mas também para os que vivem no interior e lutam para aqui permanecer.

P – Quais são os próximos projetos/ iniciativas a realizar?
R – O nosso sonho é conseguir reconstruir uma casa abandonada e fazer uma Cozinha Comunitária na aldeia da Broca, para termos um sítio onde possamos juntar mais facilmente as comunidades, faça chuva ou faça sol. Na CCB (Cozinha Comunitária da Broca) queremos fazer a transformação de produtos agrícolas em fim de época, para evitar o desperdício de alimentos que foram cultivados para seres humanos, como por exemplo doce de frutos vermelhos, marmelada, molho de tomate, fermentados, desidratados, ginjinha, etc.
Quanto aos próximos eventos sigam as nossas redes sociais: https://www.instagram.com/ageradoracoop/ e https://www.facebook.com/a.geradora.coop

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HELENA ANTUNES

Presidente do Conselho de Administração d’A Geradora – Cooperativa Integral CRL

Idade: 35 anos

Naturalidade: Beira Interior

Profissão: Antropóloga

Currículo (resumido): Mestre em Estudos de Desenvolvimento no ramo de Desenvolvimento Sustentável; Elaborou a dissertação sobre agricultura, segurança alimentar e desenvolvimento sustentável em territórios rurais; Foi o trabalho agrícola dos pais que lhe permitiu estudar em Lisboa, circunstâncias que a tornaram uma cidadã atenta à relação Natureza e Humanidade; Regressou à Beira Alta em 2019 por vontade própria e desde então tem desenvolvido diversos trabalhos em meio rural relacionados com agricultura familiar, feminismos, arte, ambiente e agroecologia; É uma d@s cofundador@s d’A Geradora – Cooperativa Integral CRL.

Livro preferido: “Os Maias”, de Eça de Queiroz

Filme preferido: “Laurence Anyways”, de Xavier Dolan

Hobbies: viajar, ler, ir ao teatro, escrever, ioga, caminhadas na Serra, jantaradas com os bons produtos da beira, do país e do mundo…

Sobre o autor

Efigénia Marques

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