O Governo aprovou, na semana passada, em Conselho de Ministros a transferência da gestão do terminal ferroviário da Guarda para a Administração dos Portos do Douro, Leixões e Viana do Castelo (APDL). Trata-se de um passo decisivo para a criação do primeiro Porto Seco do país.
O diploma concretiza a integração entre a modalidade ferroviária e marítima no transporte de mercadorias, através da gestão de infraestruturas concentrada na autoridade portuária. «O reforço da conexão com o “hinterland” do porto de Leixões é um fator decisivo para o crescimento da infraestrutura portuária e para o desenvolvimento social do território de influência, favorecendo a sua competitividade e a dos seus clientes», justificou o Governo, em comunicado. A instalação deste terminal intermodal afastado do mar e ligado a um porto marítimo por via férrea e rodoviária pode traduzir-se no aumento da competitividade das empresas desta região, na atração de novos investimentos, na criação de emprego e na redução de custos de armazenagem e transporte de mercadorias.
Nuno Araújo, presidente da APDL, entidade que mais tem dinamizado o processo do Porto Seco da Guarda, sublinha que, «no fundo, trata-se de simplificar, do ponto de vista burocrático e logístico, a forma como movimentamos mercadorias, potenciando ainda mais a ferrovia através de investimento na Guarda para que os operadores que usam a rodovia possam utilizar a ferrovia, que ganhará outra preponderância». O responsável afirma ainda que o Porto de Leixões é «alimentado por linha ferroviária, que é uma ferramenta importantíssima e indispensável para podermos implementar um Porto Seco na Guarda». O objetivo também passa pela «estratégia da descarbonização ao nível dos meios de transporte de mercadorias e ter o sector marítimo mais ligado com a ferrovia para a ligação a Espanha e ir buscar carga a zonas do país e ao país vizinho, onde atualmente é mais difícil», acrescenta Nuno Araújo.
De resto, a APDL vai investir na Guarda «numa primeira fase» cerca de 2 milhões de euros, sendo que o avanço do Porto Seco vai trazer «enormes vantagens para a competitividade do Porto de Leixões e alavancar a competitividade das empresas importadoras e exportadoras da região», afiança o presidente da APDL. Nuno Araújo revela haver já um “layout” do projeto, «com uma estimativa de investimento mais reduzido, no sentido de modernizar, para já, a plataforma existente que está limitada não só pelas habitações, mas também pelas linhas ferroviárias e, por isso, não há atualmente grande espaço para que possamos crescer». A ideia é fazer «algumas melhorias» para dar outras condições ao terminal atual e que passam, nomeadamente, pela «ampliação das linhas, colocação de novos equipamentos e criação de espaços físicos, portarias, escritórios, etc. Quanto ao futuro tentaremos perceber qual a solução de localização para construir um terminal de raiz, muito superior àquele que já temos desenhado e com um investimento muito mais elevado», compromete-se o responsável da APDL.
O terminal ferroviário da Guarda ocupa atualmente uma área de cerca de 22 mil metros quadrados. Dispõe de quatro linhas com cerca de 150 metros de extensão e uma capacidade para parquear cerca de 400 TEU (contentores). Está a cerca de 30 minutos da fronteira de Vilar Formoso e tem ligação às linhas da Beira Alta e da Beira Baixa e, através destas, a praticamente todo o território e aos principais portos nacionais. A concessão da sua gestão chegou a estar em concurso público, em meados de 2018, mas não avançou por falta de interessados. Entretanto, o espaço foi utilizado como estaleiro e zona de apoio às obras de conclusão da Linha da Beira Baixa e, futuramente, da modernização da Linha da Beira Alta. A Guarda surgiu como «destino preferencial» para o primeiro Porto Seco do país na sequência de reuniões da APDL com a Autoridade Aduaneira, a Infraestruturas de Portugal, a Agência para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, municípios e empresas.
Guarda no mapa da logística ibérica
Por cá, Sérgio Costa, presidente da Câmara da Guarda, recebeu «com muita satisfação» a aprovação do decreto-lei que transfere para a APDL a gestão do terminal.
«Este é o primeiro passo conducente à criação do Porto Seco da Guarda, mas que permite desbloquear um processo burocrático que já decorria há anos», disse o autarca, sublinhando que «a partir da publicação da legislação, a APDL poderá aqui operar a exportação e importação de mercadorias da região Norte, Centro e Sul do país». Para Sérgio Costa, esta decisão é «um passo muito importante para a afirmação cada vez mais necessária do Porto Seco na Guarda, que vai ficar no mapa da logística nacional e ibérica». O presidente do município comprometeu-se ainda a trabalhar para que, «no curto prazo, com este espaço atual – junto à estacão da CP – se comece a operar e que o Porto Seco seja uma realidade».
O edil afirmou ainda que «há investimentos que levarão algum tempo a ser concretizados no medio e longo prazo – meia dúzia de anos – como, por exemplo, a declaração de impacto ambiental, o projeto de execução, o concurso público e a obra propriamente dita». Questionado sobre a melhor localização para o Porto Seco, Sérgio Costa respondeu que «nesta fase inicial, será o atual terreno junto à estação» e que a ser construída uma outra grande infraestrutura «a tomada de decisão será feita sempre em estreita articulação com a APDL, a Infraestruturas de Portugal e o Ministério das Infraestruturas». A concluir, o autarca fez questão de assinalar «o importante papel» que Ana Abrunhosa, ministra da Coesão Territorial, e Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social, tiveram no desfecho deste processo.
Ana Mendes Godinho também deputada municipal na Câmara da Guarda pelo PS, em declarações a O INTERIOR e Rádio Altitude, diz que este «é um dia histórico e muito importante para a Guarda». Estas foram declarações feitas após o Conselho de Ministros ter aprovado a gestão do Porto Seco pelo Porto de Leixões. E no fundo é também o reconhecimento da ligação estratégica do Porto Seco em termos geográficos desta ligação entre o litoral e o resto da Europa, que eu sei que essa é também uma grande vantagem geográfica» da Guarda, acrescentou a socialista.
Por sua vez, Carlos Chaves Monteiro, vereador do PSD, diz que a decisão do Governo «é o corolário do trabalho desenvolvido pelos executivos camarários, onde se inclui o anterior, presidido por mim, em que desde a primeira hora colocámos na agenda de prioridades esta infraestrutura importante para toda a região».
No entanto, o antigo edil alertou que «este é apenas o primeiro passo para construir um processo que deverá ser muito mais do que um mero local de logística para carregar e descarregar mercadorias». Na sua opinião, deve ser «um espaço de atração de empresas de “economia circular” e produtoras de riqueza, transformando a matéria-prima em produtos acabados». Chaves Monteiro considerou também importante que o Governo adote uma «política fiscal atrativa neste território para atingir os objetivos que estão na base da criação de um verdadeiro Porto Seco».
Já Luís Couto, vereador do PS, destacou o papel da ministra Ana Mendes Godinho, também deputada municipal na Guarda, dizendo que «não há dúvidas que se deve muito ao seu trabalho esta decisão do Conselho de Ministros». O eleito acrescentou que se trata de «uma promessa cumprida» pelo secretário-geral do partido, António Costa, e espera agora que a Câmara, «tendo o trabalho mais difícil já feito, saiba dar continuidade ao processo porque estão congregadas todas as vontades à volta deste investimento».
Carlos Gomes